20 junho, 2012

Do amanhã


Era seu contentamento receber o filho à noitinha, as panelas recém saídas do fogão: o arroz colorido de cenouras, o feijão gordo de toucinhos, perfume das duas folhas de louro. Ele não reparava no tato hesitante, na voz melodiosa e menos ainda na expressão cativa que ela manifestava assim que ouvia suas coisas se espalharem barulhentas pelo interior do quarto. Viúva de marido vivo, ela confiava sua vida - sobrevivida - no futuro daquele rapaz barbado, amigo do silêncio e da rotina, que empurrava para o canto do prato a carne ensopada, olhava o copo quase vazio e levantava para o banho antes de se deitar. Assim que ele fechava a porta, sussurrando boa noite, o desenho de um sorriso surgia imediato no rosto dela. Era naquele instante exato que diariamente uma oração subia, gratidão seguida de desejo: que seu sono seja de paz e descanso para o que a de vir amanhã.

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